Dasen ou “ser ai “

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Focus group, da artista chino americana Diana Ong. 2000. A multidão sempre lembra a massa informe:as mesmas roupas, a mesma pressa. As mesmas ideias nesses rostos sem identidade.

                                                  A rotineira identidade funcional

Bom dia.

Bom dia.

Foi um bom dia assim, meio arrastado. Pelo menos não havia sido ignorado como das outras vezes. Disse um bom dia assim, meio incisivo. Porque seus cumprimentos haviam sido ignorados por ela durante a primeira semana na empresa. Dessa vez não. Ela respondeu. Respondeu, sim, apesar de ter sido uma forma meio arrastada e sem tirar os olhos do computador de responder.

A recepcionista havia se tornado sua maior obsessão da última semana. Tinha essas pequenas obsessões desnecessárias e rotativas.

Chegou a esquecer o próprio crachá de identificação para que precisasse conversar com ela. Parou em frente ao balcão, esperou que virasse. Sem virar, ela perguntou O que seria pra ti?

Esqueci meu crachá

Qual o número da tua identidade funcional?

Onde tem isso?

No crachá

Ah, então. Esqueci o crachá. Não tem como ver isso aí?

Ela aperta alt e tab e sai da tela parcialmente azul do facebook para um sistema cinza com aspecto antiquado. Ele pensa que poderia ter visto o nome, assim descobriria mais sobre a recepcionista.

Fica, por alguns minutos, pensando em como percebe muitas coisas só depois que param de acontecer. Lembra como só percebeu o barulho do maquinário constante na empresa quando ficou um dia após o expediente e ouviu os barulhos cessando, um a um, até o silêncio monótono e perturbador ser estabelecido.

Qual é teu nome?

É Ricardo

Ricardo tem uns cem. Preciso do teu último nome também.

Ele diz o último nome e fica pensando em como ela deve ser infeliz de estar ali. Talvez devesse perguntar, puxar um papo a respeito. Ele mesmo já havia sido muito infeliz em muitos empregos. Por muito tempo amaldiçoou as salas tomadas de computadores e o esquema prussiano de trabalho. Por muito tempo leu sobre o esquema prussiano de trabalho. Depois aceitou, parou de ler. Depois ficou tudo bem. Talvez por isso tenha virado um maníaco das obsessões cíclicas e desnecessárias. Por isso estava ali, buscando algo de diferente.

Focus group, 2007, Diana Ong (b.1940/Chinese-American) Computer Graphics Stock Photo 456-1863 : Superstock

Senhor, tem três Ricardo Souza no sistema.

Não tem como identificar pelo setor?

Até tem, mas o sistema travou porque dei dois cliques aqui.

Tá. Tudo bem.

Ela balbucia alguma coisa que ele não entende. Mas não pergunta nada.

Destravou?

Nada ainda.

Tem alguma outra forma de eu acessar a empresa sem o crachá?

Só com autorização expressa da chefia ou se tu lembrar teu ID funcional, aí eu preencho a mão um crachá provisório.

Tu é infeliz aqui?

Aí ela tira os olhos do computador pela primeira vez. Antes de arrastar os olhos até o canto da tela e desviá-los do computador para analisar sua cara, ela franze todo o cenho. Assustada com a pergunta intimista, solta um Que?

Nada não, ele diz, colocando a mão no bolso.

O que?

O sistema, tá rodando de novo. Qual setor tu trabalha?

Opa, olha só quem tá aqui! Tava no bolso e eu achando que tinha esquecido.

Passa o crachá na catraca de entrada e não olha pra trás.

No dia seguinte, cruza a recepção de cabeça baixa.

Bom dia, diz a voz de trás do balcão.

Um bom dia assim, meio esperançoso.

Source:https://homoliteratus.com/

 

 Dasein ou ser-aí Heidegger Martin Heidegger (1889-1976) foi um filósofo alemão que tratou sobre a existência humana, a questão do ser, a linguagem, a fenomenologia e a experiência de mundo. Ele fez uma leitura crítica da modernidade, contrapondo tanto os idealistas quanto os positivistas.

Em sua filosofia, ele retoma a questão do ser, questionando o sentido do ser, desenvolvendo uma ontologia, ou seja, o estudo do ser enquanto ser. Ele criticou o positivismo, que entende que a verdade só pode ser alcançada por meio da experiência objetiva, por instrumentos de medida; e criticou o idealismo, que busca a verdade em algo que está além de nossa percepção mundana.

Ao invés descrever o ‘ser’ por meio de conceitos abstratos ou por meio de medições científicas, Heidegger buscou compreender o ser partindo do ser existente no mundo. Com isso, contrapôs os valores da filosofia tradicional, desenvolvendo uma linguagem própria, gerando novas compreensões e estabelecendo novos significados.

Heidegger fez uma distinção entre os termos “ser” e “ente”. Para ele, o “ser” se refere ao fundamento da existência e dos modos de existir; e o “ente” corresponde à existência concreta, ou, a realidade humana, enquanto presença no mundo.

Para que possamos compreender o “ser”, precisamos estudar o “ente”, pois é este que manifesta concretamente as questões do “ser”. Desde a Grécia Antiga, o “ser” era entendido como coisa, essencial, atemporal, eterno e imutável.

Diferente dessa tradição, Heidegger propõe uma nova indagação sobre o “ser” partindo da existência concreta, entendendo este como um participante do mundo, envolvido com o mundo e com as coisas do mundo.

Um conceito muito utilizado na filosofia de Heidegger é o “Dasein”, que costuma ser traduzido por “ser-aí”, correspondendo ao ser existente, que está aí concretamente no mundo e nas situações humanas, que se envolve na vida cotidiana e prática; ao contrário da concepção de um ser meramente abstrato ou teórico.

As antigas concepções de um ser abstrato ou teórico não consideram a relação do existente com o mundo, mas o entendem como algo separado, independente do mundo.

Já o “ser-aí”, não é uma consciência separada do mundo, mas um ser que se percebe num mundo que ele próprio não criou, mas onde se encontra inserido. Além da herança biológica, cada pessoa recebe também toda uma herança cultural, que corresponde ao tempo e local onde nasceu e vive.

Este ser, que corresponde ao ser existente, está e se transforma no (e com o) mundo, sendo então um constante vir-a-ser.

Dasein é um ser de possibilidades, que se faz no mundo, enquanto é também feito pelo mundo, numa relação dialética. Deste modo, cada pessoa está condenada ao mundo, pois não há como se separar dele. Não há como não “ser-no-mundo”, pois toda pessoa se faz no (e com o) mundo.

“Heidegger sugere que o Dasein é o ente particular, ou entidade, que deve ser investigado a fim de compreendermos o ser. Isso, porque o Dasein é o único ente que pode levantar a questão acerca de seu próprio ser, que está envolvido com seu próprio ser, e, de um modo um pouco sinônimo, para quem sua própria existência está em questão.”

(Jack Reynolds, Existencialismo, 2012) O Dasein pode ser também descrito como “ser-no-mundo”, entendendo que o mundo é tudo o que compõe a vida: objetos, pessoas, ideias, valores, histórias, fantasias, enfim, tudo o que está no mundo em que vivemos.

O ser-no-mundo está sempre num mundo específico, envolvido no que faz parte de seu mundo, onde há também elementos que não fazem parte e que podem, em outro momento, fazer. E o mundo só existe se houver um ser para perceber ou imaginar, inclusive todas as outras coisas.

Assim, não existe para o ser o que não foi percebido, o que não foi desvelado ou o que não imaginamos, por isso que a existência envolve possibilidades dentro de certas condições. Ao invés de buscar ler a consciência, Heidegger propõe compreender o Dasein, o ser-aí.

“Dasein é o ente que compreende o ser, o que significa compreendê-lo em sua existência e entender a existência como possibilidade sua, de ser ou de não ser si mesmo.” (Benedito Nunes, Heidegger & Ser e Tempo, 2004)

Dasein não somente habita um espaço, como o espacializa, agindo e se fazendo no mundo da prática, sempre ocupado com ações e atividades, de modo que está sempre envolvido com outras pessoas, cuidando de si e dos outros, seja de maneira positiva, negativa ou indiferente, se projetando sempre para fora de si mesmo.

Por Bruno Carrasco.

Source: https://www.ex-isto.com/2018/06/dasein-ser-ai.html

 

Lembre-se♠ É de nossa responsabilidade: cuidar de nossa saúde, do equilíbrio físico, do bem estar orgânico, mental e espiritual.

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